quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A BELEZA DA DEMOCRACIA

Fui um dos processados durante a Operação Cajueiro. Era deputdao estadual, foram me buscar na Assembléia Legislativa e passei um dia detido. Vários amigos foram torturados, inclusive Milton Coelho, que ficou cego. Goisinho e Marcélio Bonfim também foram torturados.

No quartel do 28° BC, um oficial colocou o dedo na minha cara e falou assim: "Deputado, aqui as pessoas falam o que quer e o que não quer". Ao lado de 18 companheiros fui julgado e absolvido, na 6ª Região Militar, em 1978.

Por isso esse artigo publicado no último domingo, pelo jornalista Luiz Eduardo Costa, no JORNAL DO DIA, me emocionou. Afinal, quem fez história, tem história.

SEGUE O ARTIGO:

A BELEZA DA DEMOCRACIA

É recorrente truísmo dizer-se que a democracia é o melhor sistema político, enquanto outro não for descoberto. Como até hoje não se registrou a auspiciosa invenção, a democracia permanece dando provas de que é preciso insistir sempre para que ela se aperfeiçoe, sobretudo, no nosso caso, nunca mais nos abandone. Realizou-se, semana passada, a solenidade de transmissão do comando no quartel do 28º Batalhão de Caçadores de Aracaju. Convites expedidos, a sociedade em geral lá compareceu para prestigiar a posse do oficial que assumia, e despedir-se do que deixava o comando.

Uma integração espontânea, entre civis e militares, uma forma de homenagear o Exército Brasileiro, não por sabujismo ou adulação, como antes, mas, pelo reconhecimento do que representam as forças armadas na arquitetura democrática do poder nacional. Para quem viveu os tempos do autoritarismo, da ditadura escancarada, ficou a lembrança do que em ocasiões semelhantes acontecia. Os convites expedidos não eram simplesmente convites, eram convocações. E antes de serem postados, se fazia a avaliação pelos órgãos de segurança se os destinatários poderiam se incluir mesmo na relação daqueles considerados ¨bons brasileiros ¨, os outros, sempre excluídos, eram os deletérios subversivos, ¨ inimigos da pátria¨, portanto, indignos de penetrarem num quartel, a não ser se fossem conduzidos presos.

Em 76, quando a abertura lenta gradual e segura preconizada pelo presidente Geisel já estava em curso, um grupo de militares extremados resolveu tumultuar o processo, realizando prisões, e Aracaju foi um dos locais incluídos na planilha identificadora da ¨subversão.¨ O quartel do 28º BC, à revelia da maioria da sua oficialidade, foi tomado por militares que vieram para comandar a dura repressão, incluindo a mais abjeta e covarde tortura. Naqueles dias, Jackson Barreto , deputado federal, foi chamado ao quartel. Lá, um coronel ríspido lhe disse: ¨Deputado, aqui se fala o que se quer, e se for preciso, o que não se quer.¨ Jackson chegou como governador em exercício à solenidade de transmissão do comando para prestigiar os militares. Foi saudado com as honras de estilo.

Resumo da ópera: as ditaduras são absolutamente desnecessárias. Há sempre um equivoco trágico em toda concepção totalitária, tenha ela a cor que nela seja pintada. E é exatamente isso o que nos ensina a democracia. Jackson Barreto, como o tempo mostrou, não representava nenhum perigo para as instituições, nem precisaria ser ameaçado, pelo coronel atrabiliário, de falar o que não queria. Os militares também, com o tempo, descobriram que o poder excessivo e inconstitucional não lhes fez bem, não ajudou a fortalecer instituições, muito menos às forças armadas, agora, mais do que nunca respeitadas, exatamente pela obediência ao poder civil, com suas funções dignificadas, por não serem mais confundidas como praticantes da vergonhosa tarefa atribuída aos ¨capitães do mato¨.